O Pessoal da Velha Guarda
Programa No. 16
Transcrito por Alexandre Dias
Bonfiglio de Oliveira22-11-1951
(Collectors AER029 Lado B)Almirante: Boa noite, ouvintes do meu Brasil. Aqui estamos novamente com O Pessoal da Velha Guarda para mais uma audição revivendo êxitos do passado. Este é talvez o programa musical mais brasileiro do rádio, pois nele só entram músicas ou genuinamente brasileiras, ou aclimatadas aqui de tal forma que são consideradas brasileiras. Honra, pois, ao Pessoal da Velha Guarda.
Locutor: Depois da farra, depois de noitadas, onde se bebeu demais, comeu demais, fumou demais, tome Eno, e amanhecerá pronto para outra farra. E-N-O.
Almirante: Mário Alves foi um tão exímio chorão no cavaquinho, que seus amigos acabaram o designando menos pelo sobrenome do que pelo instrumento. Assim o nome de Mário Cavaquinho projetou-se pelos tempos a fora, trazendo até nossos dias a fama e a inspiração daquele modesto executante, que deslumbrava os amigos com o seu virtuosismo. Mário Cavaquinho tinha uma memória prodigiosa, e disso deu prova quando um dia, ouvindo pela primeira vez Ernesto Nazareth executar uma de suas músicas, pegou o seu cavaquinho, e logo após compôs uma verdadeira paráfrase, em que volta e meia perpassavam frases ou lembretes da melodia de Nazareth. Entre as muitas composições que Mário Cavaquinho nos deixou, vale ressaltar a polca-choro que ele intitulouTeu Beijo, que vai aparecer aqui agora pelo Pessoal da Velha Guarda num arranjo de Pixinguinha.
Orquestra Pessoal da Velha Guarda: Teu Beijo (Mário Alves)
Locutor: Uma comida boa é sempre fácil de comer, mas às vezes é difícil de digerir. Ajude a sua digestão com uma dose do Sal de Fruta Eno digestivo, antiácido e laxativo. Sal de Fruta Eno [trio vocal cantando E, N, O]. Quando o diapasão Eno soar novamente fiquem atentos. Logo em seguida serão mostradas as melodias E-N-O de nosso concurso Eno de hoje. Portanto, lápis, papel e boa memória.
Almirante: Está aqui uma música, ouvintes, que vem bem a propósito nos tempos de hoje. Trata-se de uma valsa de Luiz Gomes da Silva, valsa quase cinqüentenária, e que recebeu o nome de A Lâmpada. Pela gravura que se vê na parte impressa, ao lado do título vê-se que aquela lâmpada que inspirou a valsa não foi uma lâmpada como as que hoje conhecemos, isto é, uma lâmpada elétrica, mas sim um legítimo lampião de querosene dos bons tempos. A música vem hoje a propósito devido à gravíssima situação em que se encontra o Rio de Janeiro, prestes a ficar às escuras com a falta dágua no Ribeirão das Lajes. Tenha a Light toda a razão quando recomenda a economia de luz e de força. Se não houver um pouco de sacrifício de todos, todos estarão depois sofrendo males imprevisíveis. Economizem portanto luz e força. Neste particular, não sejam do contra. Tomem um Sal de Fruta Eno, e apaguem as luzes desnecessárias. Mas ouvintes, voltemos à valsa. Ela aqui vai como uma homenagem àqueles que já desencavaram seus velhos lampiões de querosene e que já estão diminuindo as possibilidades da calamidade pública. E quem sabe, ouvintes, se por falta de ajuda dos elementos não tenhamos todos de voltar aos tempos do lampião de querosene, hein? Por enquanto, vamos ao lampião, por meio da valsa de Luiz Gomes da Silva executada aqui pelo professor Lauro Araújo.
Lauro Araújo: A Lâmpada (Luiz Gomes da Silva)
Locutor: Nada de complicações, vamos facilitar as coisas. Se a sua digestão não está se processando normalmente, tome o Sal de Fruta Eno. Toda a digestão é fácil quando há Sal de Fruta Eno [trio vocal cantando E, N, O]. O diapasão Eno soou pela segunda vez no Pessoal da Velha Guarda anunciando as melodias E-N-O do nosso concurso Eno de hoje. Como sabem, a melodia E, música de hoje, dá um prêmio de 200 cruzeiros. A melodia N, música de ontem, dá um prêmio de trezentos cruzeiros, a melodia O, música de anteontem, dá um prêmio de quinhentos cruzeiros. E agora, vamos ver como andam as memórias de vocês. Melodia E [orquestra toca um samba]. Melodia N [saxofone sola uma valsa acompanhado por piano]. Melodia O [violinos tocam uma seresta].
Almirante: Aguardem novamente o diapasão Eno para confirmar as melodias E, Ene, O. Na memória dos mais antigos fixou um número bastante grande de músicas de seu tempo. Se pedirmos a alguém que já tenha passado dos 50 que nos lembre as músicas que mais o impressionaram em sua meninice, teremos uma enquete curiosa, revelando a predominância de certas melodias. Uma música que fatalmente há de aparecer em todas as respostas é a que se chamou inicialmente Meu Casamento. Seu autor foi um modesto flautista que morreu tragicamente aí por 1929 sob as rodas de um trem na estação do Engenho Novo numa tarde em que se dirigia para casa depois de sair do seu emprego de tecelão na fábrica Confiança de Vila Isabel. A música de Pedro Galdino, destinada inicialmente só à execução, recebeu, logo que ganhou popularidade, uns versos de Gutenberg Grusch. E foram esses versos, ouvintes da velha guarda, que a fizeram chegar ao máximo da fama difundindo-a por todo o Brasil. E ainda mais, versos que tiveram a influência decisiva de mudar inteiramente o seu nome. Pois de Meu Casamento, a schottisch passou a ser conhecida principalmente por Olhos de Veludo. Olhos de Veludo, de Pedro Galdino, já foi ouvida aqui com os versos. Agora, para atender a ouvintes, aqui vai ela, em arranjo especial de Pixinguinha para O Pessoal da Velha Guarda.
Orquestra Pessoal da Velha Guarda: Meu Casamento (Pedro Galdino)
Almirante: Antigamente, em cada lugar, em cada cidade por esse mesmo Brasil, iam surgindo canções que, ou ficavam restritas à terra natal, ou se difundiam pelo resto do território, levando a outros cantos as belezas melódicas daqui e dali. Aqui no Rio, por exemplo, os chorões e os seresteiros tinham em seu repertório melodias do norte ou do sul, que eram sempre indicadas com a evocação respeitosa de seus lugares de origem. Com que encanto por exemplo eram evocadas aqui modinhas e canções de Pernambuco, do Rio Grande do Sul, de Minas, da Bahia, etc. Aqui está como prova certa modinha que foi encanto de várias gerações pelo Brasil afora. Terá mais de 70 anos, e durante todo esse tempo, jamais foi esquecida. Tanto assim que pode ser hoje lembrada aqui no Pessoal da Velha Guarda. Seu nome é As Baianas, e seus autores, da música José de Aragão, e dos versos Tito Lívio.
Alcides Gerardi e Lauro Araújo: As Baianas (José de Aragão/Tito Lívio)
Almirante: Grande interesse, ouvintes, despertou, como sempre, o nosso concurso Eno da semana passada. Fizemos a primeira apuração das respostas certas e há pouco realizamos o sorteio, tendo sido premiados os seguintes ouvintes concorrentes. A melodia E, música de hoje, era o samba de Haroldo Barbosa Não se Aprende na Escola, que dará 200 cruzeiros a Sílvio Mesquita de Souza, rua Pereira Leitão, 6, em Turiaçu, aqui no Distrito Federal. Este prêmio seguirá pelo correio. A melodia N, música de ontem, era o Chiribiribi Quá Quá, marchinha de Ary Barroso. Prêmio de 300 cruzeiros para Jurandir Coelho, rua Sargento de Milícias, 1.176, Pavuna, Distrito Federal. Este prêmio seguirá pelo correio. A melodia O, música de anteontem, era o Fubá, samba de Romeu Silva, prêmio de 500 cruzeiros para Espártaco Catani, rua Amazonas 75, Sorocaba, São Paulo. Também este prêmio seguirá pelo correio.
Aqui vai, ouvintes, agora uma música que também teve sua época. Pelo título, ninguém a reconhecerá, mas pela melodia, ela há de despertar lembranças cheias de encantamento. Será bom dizer que antes que tal música mereceu em seu tempo uns versinhos pitorescos que contribuíram grandemente para a sua mais rápida popularidade. Eram quadrinhas que se iniciavam com um versinho, em que se repetia três vezes o nome peru. É evidente que nós não poderíamos nem de longe pensar em recitar aqui qualquer um daqueles versinhos. Mas é também certo que muitos ouvintes ouvindo a melodia, hão de reconstituir integralmente e de memória qualquer uma daquelas quadrinhas. Não há porém nada tão inocente como qualquer melodia. Razão por que nada nos constrange relembrar aqui a famosa. Era uma polca-marcha, e teve a melodia compilada por músicos, que faziam então parte de uma orquestra de renome. Eram eles Passos, Borneo e Barnabé. A música se chamou Morro da Favela e a instrumentação de agora é de Pixinguinha para O Pessoa da Velha Guarda.
Orquestra Pessoal da Velha Guarda: Morro da Favela (Passos/Borneu/Barnabé)
Almirante: Há músicas que os nossos ouvintes não se cansam de ouvir. Há músicas do passado que ficaram como um marco em seu gênero, o que equivale à imortalidade. Uma dessas foi a valsa escrita pelo Bonfiglio de Oliveira, o saudoso autor do choro Flamengo, chama-se ela Glória, e recebeu versos de Branca M. Coelho. Numa carta de Araguari em Minas, a ouvinte Glória [Bacelar?] nos intima a relembrar aqui a música que tem o seu nome. E nós indagamos curiosos, será ela a Glória da música de Bonfiglio?
Alcides Gerardi: Glória (Bonfiglio de Oliveira/Branca M. Coelho)
Locutor: Tudo em ordem com o Sal de Fruta Eno, intestino, fígado e estômago, tudo em ordem com o Sal de Fruta Eno [trio vocal cantando E, N, O]. Vamos conferir as melodias E, N, O, do nosso concurso Eno de hoje. Prêmio de 200, 300 e 500 cruzeiros respectivamente para quem acertar os seus nomes exatos. Atenção. Melodia E, música de hoje, [samba tocada pela orquestra], Melodia N, música de ontem, [saxofone sola uma valsa acompanhada de piano], Melodia O, música de anteontem [violinos tocam uma seresta]. O Pessoal da Velha Guarda é um presente do Sal de Fruta Eno e da Emulsão Scott aos ouvintes da Rádio Tupi do Rio de Janeiro.
Jingle em ritmo de polca:
Eu sou forte, tu és forte
Somos fortes todos nós
Emulsão de Scott
Nós gostamos de tomar
No almoço e no jantar
Tão bom tomar
Emulsão Scott
Tão bom tomarEmulsão Scott constitui a mais perfeita combinação do melhor óleo de fígado de bacalhau com cálcio e fósforo. Emulsão Scott, em todas as épocas e idades. Emulsão Scott, o tônico das gerações.
Mandem suas respostas para o concurso Eno numa folha de papel para cada resposta, endereçando-as à Rádio Tupi, Rio de Janeiro.
[Vinheta final]
Almirante: E aqui se despede dos ouvintes da Rádio Tupi do Rio de Janeiro O Pessoal da Velha Guarda em mais uma audição de saudades. Na noite de hoje vocês tiveram os arranjos especiais de Pixinguinha para O Pessoal da Velha Guarda, o cantor Alcides Gerardi, o pianista Lauro Araújo, o locutor Luis Brandão. Na próxima quinta-feira, às 20 horas, aqui estará novamente O Pessoal da Velha Guarda.
Locutor: E novamente oferecido pelo Sal de Fruta Eno.
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